“Eu gostaria de uma nova perspectiva, clara e bem temperada”. A frase foi dita em uma das últimas cenas do filme “Ratatouille” (2007), da Pixar. Anton Ego, o crítico gastronômico, a usa para pedir o melhor prato do restaurante Gusteau. Buscando uma nova experiência por meio desse gesto, ele não quer provar mais do mesmo. É com essa premissa que o Quilombo Geek nasce, trazendo para o leitor um ponto de vista diferente da Cultura Pop e Geek.

Mas antes de qualquer coisa, vamos escurecer alguns conceitos. Segundo o livro de André Barcinski, “Pavões misteriosos 1974-1983: a explosão da música pop no Brasil, o termo Cultura Pop foi criado por críticos na Inglaterra na década de 1950 e se refere a produtos massivos, de ampla difusão na mídia, produzidos de forma seriada. Por isso, séries, filmes, livros, quadrinhos e músicas são partes da Cultura Pop.
Já para Cultura Geek, usaremos o conceito criado por Jason Tocci em 2009 na sua tese de doutorado: “Geek Cultures: Media and Identity in the Digital Age”. De acordo com ele, o termo cultura geek é um interesse em em tecnologia, ficção científica, literatura fantástica, card games, jogos de tabuleiro, histórias em quadrinhos, cinema, séries televisivas, jogos eletrônicos e estudiosos de teorias científicas que perpassam a ficção científica como química e física.
Além disso, a Cultura Geek faz parte da Cultura Pop como subgênero, segundo Karen Keslen Kremes na dissertação de mestrado “Cultura Geek e Tecnologia: Reflexões sobre os híbridos de videogame e cinema interativo”. Ambos os conceitos são vastos, mas aqui no QG nos dedicaremos a falar principalmente de séries, filmes, livros e quadrinhos.
A Cultura Pop sempre esteve presente na minha vida. Minha mãe me acostumou a ver televisão desde criança, para me manter quieta, então consumo filmes, séries e animações antes mesmo de aprender a falar (não cabe você julgar se isso foi certo ou errado). Conforme fui crescendo, esses produtos foram despertando a minha curiosidade sobre como eram feitos, qual era a intenção deles, de onde vinham.
Quando a internet chegou em minha casa, entre 2014 e 2015, comecei a acompanhar youtubers que produziam conteúdos sobre a Cultura Pop: resenhas, análises, vídeos com curiosidades. Percebi em mim uma vontade de fazer a mesma coisa, mas nunca me sentia capacitada. Especialmente quando o assunto era o eixo geek, por ser majoritariamente dominado por homens brancos cis, sentia que seria crucificada por qualquer besteira que falasse.
Lembro de ter falado para um amigo próximo que iria fazer um canal no youtube, ele me desejou boa sorte. Na época, eu ainda não tinha ideia como as coisas funcionavam para os criadores de conteúdo negros e pensei que os meus maiores problemas seriam a falta de um equipamento adequado e o conhecimento quase nulo em edição.

No entanto, eu sou negra e mulher (sempre bom destacar) e “ser negra e mulher no Brasil, repetimos, é ser objeto de tripla discriminação, uma vez que os estereótipos gerados pelo racismo e pelo sexismo a colocam no mais baixo nível de opressão”, como bem afirma Lélia Gonzalez em “O lugar da mulher negra brasileira”.
Com a autoestima que tinha na adolescência, não estava pronta para me expor. Então, durante muito tempo preferi ficar no lugar confortável de consumidora desses conteúdos, dando pitacos quando convinha em rodas de amigos, mas sempre me sentindo desinteressante demais (por gostar MUITO de super-heróis) e sem conhecimento suficiente. As informações chegavam até mim, como peças de um quebra-cabeça de mil peças e você deve saber que é difícil montar um desses sozinhe.
Decidi que o melhor, por hora, seria escrever sobre mim, minhas experiências e como me sentia. Mesmo sem computador em casa, comecei um blog onde publicava textos ocasionalmente. Após alguns anos, diversifiquei o conteúdo, passei a trazer resenhas, curiosidades sobre filmes, super-heróis, indicações de filmes e séries e com a pandemia tive tempo para postar com mais frequência.
Certo dia, enquanto produzia um conteúdo para o “Reflexões de Uma Desocupada”, sofri uma crise existencial pesada. Me questionei naquele momento, senão era hora de separar as coisas e ter um espaço só para falar de Cultura Pop, a forma como a vejo. A ideia ficou martelando na minha cabeça e eu tinha inúmeros motivos para deixar tudo como estava, o principal deles sempre pesava: a falta de tempo.
Contudo, a vida anda cada vez mais efêmera no meio da loucura que estamos vivendo. E se eu não fizesse, ninguém faria por mim. Prefiro me frustrar com algo que não deu certo do que com algo que sequer tentei.
Assim nasceu o Quilombo Geek, um espaço que vê o entretenimento além da superficialidade. Porque aprendi em uma das maravilhosas aulas de telejornalismo na faculdade que o entretenimento também pode ser informação. Caso você não esteja familiarizado com o termo, ele se refere a tudo aquilo que nos proporciona um divertimento, um momento relax. Logo, a Cultura Pop faz parte disso.
O nome faz alusão a lugar de resistência. Os quilombos eram onde meus ancestrais se organizavam contra um sistema que os desumanizava. Um lugar no qual eles se reuniam de forma fraterna e livre, cuidavam uns dos outros, segundo Elisa Larkin Nascimento afirma em “Afrocentricidade: Uma Abordagem Epistemológica Inovadora”.

Este site é de alguma forma um legado dos meus ancestrais. Não só dos escravizados, mas de todos aqueles que vieram antes de mim, como meus pais e os pais deles. Porque me ensinaram a acreditar nos meus sonhos. O Quilombo Geek sempre esteve dentro de mim e agora, estou trazendo ele para o mundo.
Mas, o trabalho aqui não é só meu. Um quilombo exige coletividade e já tenho colaboradores que estarão alimentando esta plataforma e as nossas redes sociais com resenhas de filmes, séries, HQs e livros, análises de problemáticas nesses produtos, indicações também e perfis de personalidades históricas para você se inspirar. Estamos com as portas abertas para novos membros, qualquer um é bem vinde!
Quer seja com posts em forma de texto, threads e vídeos, nosso propósito é trazer um escape e te fazer pensar também sobre coisas que passaram, ou não, sobre sua mente.