Escrito pela haitiana-estadunidense Ibi Zoboi, “Orgulho” é um reconto de “Orgulho e Preconceito”, de Jane Austen. Mas, em vez do interior da Inglaterra, a história tem a charmosa e barulhenta vizinhança do Brooklyn, em Nova Iorque, nos Estados Unidos, como pano de fundo. Elizabeth Bennet se transforma na afrolatina Zuri Benitez, uma jovem que ama o lugar onde mora e tem orgulho da sua herança.
A protagonista está ansiosa pela chegada da irmã mais velha Janae, que vem passar as férias da faculdade em casa. Ela não vê a hora de fofocar com a primogênita pelas ruas que conhece desde criança, apesar do processo de gentrificação do bairro incomodá-la bastante. Sua raiva aumenta com a chegada da família Darcy, que promete colocar os planos de um verão perfeito por água abaixo.

Preciso pontuar, no entanto, que ainda não li o livro mais famoso de Austen, por falta de oportunidade mesmo. Logo, não terei como comparar as duas obras, mas já assisti ao filme muitas vezes.
A história de amor se desenvolve entre Darius Darcy, uma variante do senhor Darcy, e Zuri através de um clássico “opostos que se atraem”. Devo confessar, que no início Darius é o típico garoto rico insuportável com complexo de superioridade, então, fica difícil se afeiçoar a ele. Porém, à medida que ele e Benítez se aproximam, vamos nos aprofundando nas camadas do rapaz, entendendo porque o garoto se esconde em uma armadura.
Já Zuri é quase uma pick me girl (estereótipo muito usado no cinema e na literatura para descrever uma personagem que é “diferente” por não gostar de “coisas de mulher”), entretanto, a autora tem o discernimento de construí-la como uma menina muito determinada e que luta por pertencimento. Mais uma personagem de fácil identificação.

Sem deixar que a narrativa fique boba, a autora nos envolve a cada capítulo. Pautando além da tensão romântica entre o casal principal, temas como classe, gênero, raça, ancestralidade e a gentrificação, como já mencionado no início. O resultado é um enredo que te prende a continuar para saber qual será o desfecho. A escrita de Zoboi é simples, portanto, a leitura é mais rápida e fluida. Ela conversa bem com o público para o qual é destinado, o adolescente.
O relacionamento das irmãs Benitez, Marisol e as gêmeas Layla e Kayla se juntam a Janae e Zuri, também ajuda a tornar a trama mais divertida e cativante. Contudo, tantas personalidades fortes acabam se sobrepondo uma à outra e senti falta de poder conhecer melhor a Mari. Apesar disso, Ibi tem o cuidado de escrever uma protagonista que não se perde em meio a tantas pessoas interessantes no romance.
A ancestralidade é um dos pontos principais da obra. Oxum é quem guia o nosso enemies to lovers (inimigos que se apaixonam). A princípio, eu não tinha compreendido o peso dessa decisão da autora, mas então, notei ser um ato decolonial. Normalmente, é a deusa Afrodite quem assume a personificação do amor, ou seja, uma deusa branca cultuada em um país europeu, vista com certa admiração. Ao trazer uma figura presente nas religiões de matriz-afro, Ibi Zoboi quebra com um paradigma e enriquece a trama.

“Orgulho” é aquilo que sempre quisemos que acontecesse nos produtos da Cultura Pop. Não é mais uma narrativa sobre o sofrimento que o racismo nos causa. É um livro gostoso de ler, se possível acompanhado com um café e pão de queijo, ideal para por fim em uma ressaca literária.